A ARMA DA PROPAGANDA
O governo Médici não se limitou à repressão. Distinguiu claramente entre um setor significativo mas minoritário da sociedade, adversário do regime, e a massa da população que vivia um dia a dia de alguma esperança nesses anos de prosperidade econômica. A repressão acabou com o primeiro setor, enquanto a propaganda encarregou-se de, pelo menos, neutralizar gradualmente o segundo. Para alcançar este último objetivo, o governo contou com o grande avanço das telecomunicações no país, após 1964. As facilidades de crédito pessoal permitiram a expansão do número de residências que possuíam televisão: em 1960, apenas 9,5% das residências urbanas tinham televisão; em 1970, a porcentagem chegava a 40%. Por essa época, beneficiada pelo apoio do governo, de quem se transformou em porta-voz, a TV Globo expandiu-se até se tornar rede nacional e alcançar praticamente o controle do setor. A propaganda governamental passou a ter um canal de expressão como nunca existira na história do país. A promoção do “Brasil grande potência” foi realizada a partir da Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP), criada no governo Costa e Silva, mas que não chegou a ter importância nesse governo. Foi a época do “Ninguém segura este país”, da marchinha Prá Frente, Brasil, que embalou a grande vitória brasileira na Copa do Mundo de 1970.
Boris Fausto, História do Brasil. Adaptado.
A estratégia de dominação empregada pelo governo Médici, tal como descrita no texto, assemelha✄se, sobretudo, à seguinte recomendação feita ao príncipe - ou ao governante - por um célebre pensador da política:
O texto se baseia na afirmação de que o governo Médici se valeu não apenas da opressão, da “repressão”, mas também da “propaganda”. Essas diferentes estratégias foram utilizadas de acordo com a divisão da sociedade em dois setores distintos:
- para combater o primeiro setor – de uma minoria que fez oposição direta ao regime – foi adotada a estratégia da repressão;
- para neutralizar “gradualmente” o segundo setor – a massa da população que depositava algum tipo de esperança na prosperidade econômica – contou-se com a propaganda.
Nesse paralelo, o “mal”, em Maquiavel – que tem como correspondente a “repressão”, no governo Médici – deve ser feito “de uma só vez”. O “bem” – “as facilidades de crédito” que proporcionaram que, em uma década, o número de residências que possuíam televisores passasse de 9,5% a 40%; “a expansão das telecomunicações" e a esperança de prosperidade – deve ser feito “aos poucos”, “gradualmente”.