Peroração, do latim perorātio, peroratiōnis, de perorāre, significa concluir, arrematar, acabar. Corresponde à parte final do sermão, caracterizada geralmente pela recapitulação, pela amplificação de uma ideia e pela comoção do auditório. Sua finalidade última é comover e mover os ouvintes, isto é, emocionar e mover o ânimo do público para a ação.
(Adaptado de Flávio Antônio Fernandes Reis, “Peroração”. Disponível em www.edtl.fcsh.unl.pt/encyclopedia/peroracao. Acessado em 06/10/2020.)
“Mortos, mortos, desenganai estes vivos! Dizei-nos que pensamentos e que sentimentos foram os vossos, quando entrastes e saístes pelas portas da morte. (...) Entre essas duas portas se acha subitamente o homem no momento da morte, sem poder tornar atrás, nem parar, nem fugir, nem dilatar, senão entrar para onde não sabe, e para sempre. Oh que transe tão apertado! Oh que passo tão estreito! Oh que momento tão terrível!”
(Antonio Vieira, “Sermão de 1672”. Sermões de Quarta-feira de Cinza. A arte de morrer: São Paulo: Nova Alexandria,1994, p. 65.)
a) Identifique e explique as duas estratégias retóricas utilizadas por Vieira ao encaminhar-se para a conclusão do Sermão de 1672.
b) Com que sentimentos o pregador busca sensibilizar os ouvintes? Que ação procura estimular nos cristãos?
a) No trecho transcrito, Vieira se utiliza de alguns procedimentos retóricos, dos quais extrai efeitos importantes para a condução de seus argumentos. Logo no início, ele se utiliza da apóstrofe (“Mortos, mortos, desenganai estes vivos!”), fingindo recorrer a uma espécie de argumento de autoridade, ou seja, conclama os mortos a que transmitam suas experiências aos vivos. Em seguida, utiliza-se do paralelismo (“sem poder tornar atrás, nem parar, nem fugir, nem dilatar”), para, com a repetição, ampliar o impacto sobre o ouvinte, expondo o impasse em que este se encontraria, na situação pós-morte. Por fim, ainda uma vez se utiliza do paralelismo (“Oh que transe tão apertado! Oh que passo tão estreito! Oh que momento tão terrível!”), buscando antecipar o estado de espírito que tomaria conta do ouvinte quando este se encontrasse naquela situação. Pode-se ainda referir a alegoria, na representação do momento em que o homem é colocado entre a morte e a definição do caminho a seguir (céu / inferno, salvação / punição) como o espaço entre duas portas. Todas essas são estratégias bastante usuais na estética barroca. Com elas, o enunciador retoma e reforça o argumento central da pregação: o cristão deve viver desenganado da vida material e voltar-se para a vida eterna.
b) O pregador recorre ao terror para impactar os ouvintes e despertar neles o temor diante da morte. Para isso, coloca o homem entre duas portas: aquela que o traz da vida para a morte e aquela que o conduz da morte para a eternidade; para baixo, fica o que, em outro ponto do sermão, ele designa de “precipício que vai parar no Inferno”, isto é, a condenação. O enunciador chama a atenção dos ouvintes para as verdades transcendentes, que estão além da realidade material imediata e efêmera. Com isso, pretende estimular neles a disposição em seguir as ações salvacionistas preconizadas pelo Cristianismo: abdicar da vida material (pré-morte) e dedicar-se à salvação da alma (pós-morte).