Uma das folhas de ontem estampou (...) o programa da recepção presidencial em que, diante do corpo diplomático, da mais fina sociedade do Rio de Janeiro, aqueles que deviam dar do país o exemplo das maneiras mais distintas e dos costumes mais reservados elevaram o Corta-jaca à altura de uma instituição social. Mas o Corta-jaca de que eu ouvira falar há muito tempo, que vem a ser ele, Sr. Presidente? A mais baixo, a mais chula, a mais grosseira de todos os danças selvagens, a irmã gêmea do batuque, do cateretê e do samba. Mas nos recepções presidenciais o "Corta-jaca" é executado com todas as honras da música de Wagner, e não se quer que a consciência deste país se revolte, que as nossas faces se enrubesçam e que a mocidade se ria!
Discurso do senador Rui Barbosa, Diário do Congresso Nacional,
8/11/1914, p. 2789.
A partir do texto, identifique a alternativa correta:
No ano de 1914, durante a presidência de Hermes da Fonseca (1910-1914), a artista e musicista Nair de Teffé (primeira-dama) realizou uma apresentação da música Corta-Jaca (composta em 1895 por Chiquinha Gonzaga) em um dos saraus que promovia dentro do Palácio do Catete (sede da presidência da República à época). A música consiste em um maxixe, ritmo que, junto ao lundu e ao choro, possuía uma forte disseminação entre os setores populares desde as últimas décadas do século XIX. Tais formações musicais eram associadas a grupos marginalizados.
As elites do período interpretavam esses ritmos como algo inferior, desclassificando-os como incapazes de possuírem a qualidade e a sofisticação da música erudita europeia. Tratava-se de estilos musicais que remetiam a um Brasil imperial, rural, arcaico e empobrecido, que deveria ser superado com a ascensão da República e seus ideais de progresso e cosmopolitismo. Nesse sentido, a opinião do então senador Rui Barbosa expressa as concepções das elites republicanas, atreladas a uma visão de cultura na qual os cânones europeus determinavam os critérios qualitativos.