Leia o texto de Adilson Citelli.
A revista americana Newsweek se fazia anunciar, em cartazes publicitários afixados em alguns pontos de vendas, como aquela que não persuadia, mas informava. Afora querer convencer-nos acerca do conhecido mito da neutralidade jornalística, a revista parecia desejosa de exorcizar(-se?) um demônio que vincula à persuasão alguns qualificativos como fraude, engodo, mentira. Deixar claro, nesse caso, uma atitude antipersuasiva objetiva fixar uma imagem de respeitabilidade/ credibilidade junto aos leitores. Supondo-se que a revista espelhasse a mais completa lisura, o mais profundo aferramento aos princípios de uma informação incontaminada pela presença de interesses vários, ainda assim estaria ela isenta do ato persuasivo? A resposta é não. Afinal, o próprio slogan da revista, aquela que não persuade, já nos remete à ideia de que estamos diante de um veículo marcado pela correção e honestidade, diferente de outros, e no qual o leitor pode confiar plenamente. De certo modo, o ponto de vista do receptor é dirigido por um emissor que, mais ou menos oculto, e falando quase impessoalmente, constrói sob a sutil forma da negação uma afirmação cujo propósito é o de persuadir alguém acerca da verdade de outrem. Isso nos revela a existência de graus de persuasão: alguns mais ou menos visíveis, outros mais ou menos mascarados.
(Linguagem e persuasão, 1995.)
a) A respeito do anúncio da Newsweek, o autor do texto percebe uma contradição. Qual?
b) Considerado o contexto, que significado tem “-se?” em “exorcizar(-se?)”? Explique
a) A contradição é identificada no slogan da revista Newsweek, "aquela que não persuade". Para o professor Adilson Citelli, embora a revista defenda a tese de que não persuade, mas apenas informa, o enunciado contém uma forma sutil de persuasão. Fundado na premissa de que a neutralidade jornalística é um mito, o slogan da revista quer, sim, convencer o leitor de que se trata de um veículo de comunicação "marcado pela correção e honestidade", uma vez que circula na sociedade a ideia de que a persuasão está associada a noções como "fraude, engodo, mentira".
b) Ao acrescentar o pronome "-se", seguido de uma interrogação, o autor do texto levanta a hipótese de que o exorcismo talvez estivesse se voltando contra a própria revista. Esse acréscimo estabelece o pressuposto de que a revista, no passado, já tenha persuadido seu público a respeito de certas mentiras, mas agora quer se livrar dessa marca. Neste contexto, portanto, o pronome "-se" tem significado reflexivo, equivalente a "a si própria", "a si mesma".