Texto 1

Para René Descartes, o que fundamenta o método universal para conhecer o mundo é a reta razão, que pertence a todos os homens, sendo “a coisa mais bem distribuída do mundo”. Mas o que é essa reta razão? “A faculdade de julgar bem e distinguir o verdadeiro do falso é propriamente aquilo que se chama bom senso ou razão, que é naturalmente igual em todos os homens”. A unidade das ciências remete à unidade da razão. E a unidade da razão remete à unidade do método. O saber deve basear-se na razão e repetir sua clareza e distinção, que são os únicos pressupostos irrenunciáveis do novo saber.

(Giovanni Reale e Dario Antiseri. História da filosofia, 1990. Adaptado.)

Texto 2

Quase sem exceção, os filósofos colocaram a essência da mente no pensamento e na consciência. O homem era o animal consciente, o animal racional. Mas, para Schopenhauer, a consciência é a simples superfície da nossa mente. Sob o intelecto consciente está a vontade inconsciente, uma força vital, persistente, uma vontade de desejo imperioso. Às vezes, pode parecer que o intelecto dirija a vontade, mas só como um guia conduz o seu mestre. Nós não queremos uma coisa porque encontramos motivos para ela, encontramos motivos para ela porque a queremos; chegamos até a elaborar filosofias e teologias para disfarçar os nossos desejos. Daí a inutilidade da lógica: ninguém jamais convenceu alguém usando a lógica. Para convencer um homem, é preciso apelar para o seu interesse pessoal, seus desejos, sua vontade.

(Will Durant. A história da filosofia, 1996. Adaptado.)

a) Com base no texto 1, justifique por que o método de Descartes aspira à universalidade. Explique a importância da matemática para a produção de conhecimentos dotados de clareza e distinção.

b) Em que consiste a ruptura filosófica estabelecida por Schopenhauer na relação entre razão e emoção? Explique a diferença entre Descartes e Schopenhauer quanto ao papel da consciência na relação com a realidade.

a) O método de Descartes aspira à universalidade porque o seu projeto inicial é o de uma ciência única, baseada na razão, compreendida também como única e universal. Como diz o texto, a razão, para Descartes, é naturalmente igual em todos os homens, e essas universalidade e unidade ligam-se à universalidade e à unidade do método e da ciência baseada nele. Quanto à matemática, desde o início do seu pensamento, Descartes a toma como referência e inspiração para toda a ciência e para a filosofia, já que os métodos matemáticos, marcados pelo rigor e a precisão, apontariam para respostas indiscutíveis. Assim como as demonstrações matemáticas são claras e distintas, o conhecimento na nova ciência também deveria exigir clareza e distinção

b) A tradição dominante na filosofia ocidental foi a de considerar a razão e a consciência como elementos centrais ao abordar assuntos tais quais o conhecimento verdadeiro, a liberdade humana, a ética e a política. A ruptura representada pelo pensamento de Schopenhauer gira em torno da definição da vontade como elemento central do que define o ser humano, o que coloca as emoções num papel muito mais importante em relação à razão do que na tradição anterior. Exatamente por isso, Schopenhauer diferencia-se de Descartes, ao considerar que a consciência é a superfície de forças mais determinantes e profundas no ser humano, relacionadas à vontade. Já em Descartes, a consciência humana tem caráter autotransparente, sendo capaz de contemplar-se inteiramente, além de racional e radicalmente livre.