Texto 1

Um levantamento do Instituto Datafolha divulgado em maio de 2014 apontou que 61% dos eleitores são contrários ao voto obrigatório. O voto obrigatório é previsto na Constituição Federal – a participação é facultativa apenas para analfabetos, idosos com mais de 70 anos de idade e jovens com 16 e 17 anos.

Para analistas, permitir que o eleitor decida se quer ou não votar é um risco para o sistema eleitoral brasileiro. A obrigatoriedade, argumentam, ainda é necessária devido ao cenário crítico de compra e venda de votos e à formação política deficiente de boa parte da população.

“Nossa democracia é extremamente jovem e foi pouco testada. O voto facultativo seria o ideal, porque o eleitor poderia expressar sua real vontade, mas ainda não é hora de ele ser implantado”, diz Danilo Barboza, membro do Movimento Voto Consciente.

O sociólogo Eurico Cursino, da Universidade de Brasília (UnB), avalia que o dever de participar das eleições é uma prática pedagógica. Ele argumenta que essa é uma forma de canalizar conflitos graves ligados às desigualdades sociais no país. “A democracia só se aprende na prática. Tornar o voto facultativo é como permitir à criança decidir se quer ir ou não à escola”, afirma.

Já para os defensores do voto não obrigatório, participar das eleições é um direito e não um dever. O voto facultativo, dizem, melhora a qualidade do pleito, que passa a contar majoritariamente com eleitores conscientes. E incentiva os partidos a promover programas eleitorais educativos sobre a importância do voto.

(Karina Gomes. “O voto deveria ser facultativo no Brasil?”. www.cartacapital.com.br, 25.08.2014. Adaptado.)

Texto 2

Há muito tempo se discute a possibilidade de instauração do voto facultativo no Brasil. Mas são diversos os fatores que travam a discussão.

Atualmente, é a Lei nº 4737/1965 que determina o voto como obrigatório no Brasil, além dos dispositivos e penas a quem não comparece ao pleito. Com a imposição, o país segue na tendência contrária ao resto do mundo. Estudo divulgado pela CIA, que detalha o tipo de voto em mais de 230 países no mundo, mostra que o Brasil é um dos (apenas) 21 que ainda mantém a obrigatoriedade de comparecer às urnas.

Para Rodolfo Teixeira, cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB), a atual descrença na classe política pode levar a uma grave deserção do brasileiro do processo eleitoral. O jurista Alberto Rollo, especialista em Direito Eleitoral e membro da comissão de reforma política da OAB de São Paulo, concorda e acredita que o eleitor brasileiro ainda é “deficitário” do ponto de vista de educação política, sem ser maduro o suficiente para entender a importância do voto: “Se [o voto facultativo] fosse implementado hoje, mais da metade dos eleitores não votaria. Isso é desastroso”, afirma.

O cientista político e professor da FGV-Rio Carlos Pereira pensa diferente. O especialista acredita que as sete eleições presidenciais depois do fim da ditadura militar mostram que o momento democrático do Brasil está consolidado. O voto facultativo seria mais um passo a uma democracia plena.

“O argumento de que o eleitor pobre e menos escolarizado deixaria de votar parte de um pressuposto da vitimização. É uma visão muito protecionista”, diz Pereira. “O eleitor mais pobre tem acesso à informação e é politizado: ele sabe quanto está custando um litro de leite, uma passagem de ônibus, se o bairro está violento, se tem desemprego na família. É totalmente plausível que ele faça um diagnóstico e decida em quem votar e se quer votar.”

(Raphael Martins. “O que falta para o Brasil adotar o voto facultativo?”. http://exame.abril.com.br, 01.08.2017. Adaptado.)

Com base nos textos apresentados e em seus próprios conhecimentos, escreva uma dissertação, empregando a norma-padrão da língua portuguesa, sobre o tema:

O voto deveria ser facultativo no Brasil?

Como em outras edições de seu vestibular, a Unesp requisitou aos candidatos a elaboração de uma dissertação sobre um assunto de interesse social. Este ano, era preciso responder à pergunta-tema: “O voto deveria ser facultativo no Brasil?”.

A proposta trouxe, como subsídio, duas reportagens sobre o tema, com um elenco de opiniões favoráveis e contrárias à adoção do voto facultativo no país. Tendo em vista a apresentação do tema, o candidato deveria apresentar uma resposta clara à questão, embora fosse aceitável e interessante matizá-la com considerações a respeito de outras formas de se ver o problema.

Na construção do posicionamento, seria possível levar em conta, entre outros, os seguintes encaminhamentos:

A FAVOR DO VOTO FACULTATIVO

- O voto facultativo expressa um respeito maior ao princípio da liberdade dos cidadãos, já que permite uma expressão mais livre da sua vontade e reflete a concepção do voto como direito, e não como mais um dos deveres dos indivíduos;

- O fim do voto obrigatório tende a favorecer uma participação política mais consciente, pois apenas as pessoas interessadas em votar (potencialmente mais informadas sobre questões políticas e envolvidas com elas) participariam das eleições;

- O voto obrigatório, acompanhado da imposição de penas em caso de desobediência, pode ser visto como um abuso do poder do Estado. Além disso, envolve uma visão paternalista/protecionista a respeito dos cidadãos, já que estes às vezes não são vistos como capazes para decidir de forma autônoma sobre seu voto. Por questões desse tipo, essa opção não faz parte do regulamento de outros países;

- Num contexto de crise de representatividade por que o país passa, o não comparecimento às eleições pode ser visto como uma forma legítima de a população expressar o seu descontentamento quanto às opções existentes.

 CONTRA O VOTO FACULTATIVO

- O voto facultativo acentuaria as desigualdades e distorções de representatividade de um dos países mais desiguais do mundo. Seja por desinformação, seja pela falta de tempo livre e dificuldade de pagar pelo custo de deslocamento, a população mais pobre pode comparecer menos às eleições, o que aumentaria o peso relativo da elite econômica, num contexto em que este setor da população já tem seus interesses mais bem representados nas esferas governamentais;

- O voto obrigatório, considerando principalmente o caráter recente da nossa democracia, tem papel formativo. A necessidade de participar das eleições leva todos os cidadãos aptos ao voto a se informar minimamente sobre os candidatos e a refletir sobre os rumos da sua cidade, do seu Estado e do seu país. Sendo assim, torna-se um fator importante para o aprofundamento da democracia no Brasil;

- O voto facultativo pode aumentar os danos causados por práticas como a compra de voto ou qualquer outra forma de direcionamento da vontade dos eleitores, já que pessoas envolvidas em práticas como o clientelismo continuariam comparecendo às urnas, enquanto muitos dos outros eleitores deixariam de fazê-lo;

- Tendo em vista o contexto de desencantamento com a democracia no Brasil atual, a adoção do voto facultativo neste momento poderia redundar numa falta de comparecimento tão expressiva, que até colocaria em questão a legitimidade de governantes eleitos.