Texto 1

Todo ser humano tem um direito legítimo ao respeito de seus semelhantes e está, por sua vez, obrigado a respeitar todos os demais. A humanidade em si mesma é uma dignidade, pois um ser humano não pode ser usado meramente como um meio (instrumento) por qualquer ser humano.

(Immanuel Kant. A metafísica dos costumes, 2010. Adaptado.)

Texto 2

Ao se assenhorar de um Estado, aquele que o conquista deve definir as más ações a executar e fazê-lo de uma só vez, a fim de não ter de as renovar a cada dia. Deve-se fazer as injúrias todas de um só golpe. Quanto aos benefícios, devem ser concedidos aos poucos, de sorte que sejam mais bem saboreados.

(Nicolau Maquiavel. O príncipe, 2000. Adaptado.)

a) Considerando o texto 1, explique por que a ética de Kant apresenta um alcance universalista. Justifique sua compatibilidade com o Iluminismo filosófico.

b) Considerando o texto 2, explique a posição assumida por Maquiavel em relação à manipulação política. Justifique a incompatibilidade entre a ética de Kant e os procedimentos recomendados por Maquiavel para a manutenção do poder político.

a) Kant, ao enunciar que todo ser humano é obrigado a respeitar os demais, sinaliza que a obrigação é uma regra, ou lei, a qual é determinada pela razão – por consequência, de caráter universalista –, e não por uma inclinação ou desejo particular. Assim, têm-se as máximas morais que orientam as ações humanas como fins, e não como instrumentos ou meios para se obterem certos objetivos. Deste modo, o filósofo afirma que a ideia de humanidade é uma dignidade, ou seja, pura em si mesma. O projeto iluminista pretende que o homem pense bem por si próprio, faça um exame crítico e, portanto, atinja a autonomia, não permanecendo, assim, na menoridade, na qual é guiado por outras ideias e pensamentos sem qualquer exame crítico. Em outras palavras, o iluminismo quer um homem guiado por si mesmo e em busca de um fim (no caso, a autonomia) racional.

b) Em Maquiavel, há uma separação total entre ética e política. Por exemplo, segundo o texto, as más ações devem se dar de modo intenso, enquanto os benefícios aos poucos, se o governante pretender obter sucesso e permanecer no poder. Tem-se, portanto, um modo de o governante buscar os meios para tais resultados, ou seja, manipular os homens e usá-los como meios para atingir os fins do Estado ou daquele que está à frente do poder. A filosofia de Maquiavel, portanto, é contrária à kantiana, na medida em que o homem nunca deve ser usado como meio. Outra diferença está no fato de que Kant vê a ética como máximas morais que guiam nossas ações, enquanto para Maquiavel tais máximas se diluem na busca de meios para permanência no poder.