Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de dona Plácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e, conseguintemente, que saí quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: - Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.
Machado de Assis, Memórias póstumas de Brás Cubas.
Não sei por que até hoje todo o mundo diz que tinha pena dos escravos. Eu não penso assim. Acho que se fosse obrigada a trabalhar o dia inteiro não seria infeliz. Ser obrigada a ficar à toa é que seria castigo para mim. Mamãe às vezes diz que ela até deseja que eu fique preguiçosa; a minha esperteza é que a amofina. Eu então respondo: “Se eu fosse preguiçosa não sei o que seria da senhora, meu pai e meus irmãos, sem uma empregada em casa”.
Helena Morley, Minha vida de menina
Nos dois textos, obtém-se ênfase por meio do emprego de um mesmo recurso expressivo, como se pode verificar nos seguintes trechos:
O comando da questão solicita que se aponte a alternativa em que um mesmo recurso expressivo tenha sido empregado em dois fragmentos para obter ênfase.
Nota-se a presença de uma sequência "é que", tanto no fragmento de Machado ("Verdade é que ao lado dessas faltas, coube-me..."), quanto no de Morley ("Ser obrigada a ficar à toa é que seria castigo").
Pode-se considerar que em ambos os casos ocorre efeito de ênfase, no entanto não seria correto afirmar tratar-se de um "mesmo recurso", tal como o enunciado requer.
No excerto machadiano, houve deslocamento do verbo ser, que ficou posposto ao predicativo (o termo "verdade"). Com isso, o verbo ficou imediatamente antes da conjunção integrante que, formando a expressão "é que".
No excerto de Morley, a expressão "é que" não tem função sintática, ou seja, é efetivamente expressão de realce, ou em termos técnicos, um caso de clivagem.
Em suma, há efeito de ênfase nos dois excertos, mas por meio de recursos distintos.