Leia o soneto “A uma dama dormindo junto a uma fonte”, do poeta barroco Gregório de Matos (1636-1696), para responder a questão.

À margem de uma fonte, que corria,
Lira doce dos pássaros cantores
A bela ocasião das minhas dores
Dormindo estava ao despertar do dia.

Mas como dorme Sílvia, não vestia
O céu seus horizontes de mil cores;
Dominava o silêncio entre as flores,
Calava o mar, e rio não se ouvia.

Não dão o parabém à nova Aurora
Flores canoras, pássaros fragrantes,
Nem seu âmbar respira a rica Flora.

Porém abrindo Sílvia os dois diamantes,
Tudo a Sílvia festeja, tudo adora
Aves cheirosas, flores ressonantes.

(Poemas escolhidos, 2010.)

A sinestesia consiste em transferir percepções de um sentido para as de outro, resultando um cruzamento de sensações.

(Celso Cunha. Gramática essencial, 2013.)

Verifica-se a ocorrência desse recurso no seguinte verso:

  • a

    “Flores canoras, pássaros fragrantes,” (3ª estrofe)

  • b

    “À margem de uma fonte, que corria,” (1ª estrofe)

  • c

    “Porém abrindo Sílvia os dois diamantes,” (4ª estrofe) 

  • d

    “Dominava o silêncio entre as flores,” (2ª estrofe) 

  • e

    “O céu seus horizontes de mil cores;” (2ª estrofe)

O cruzamento de sensações típico da sinestesia ocorre na atribuição do adjetivo “canoras” (que canta com harmonia, melodioso) a flores, bem como a atribuição de “fragrantes” (que têm cheiro agradável, fragrância) a pássaros. Assim, cruzam-se referências à audição e ao olfato. Além da sinestesia, verifica-se nesse exemplo a hipálage, figura de linguagem que consiste em atribuir a um elemento uma qualidade que, a rigor, pertence a outro.