No conto “Amor”, de Clarice Lispector, após ver um cego mascando chicletes, a personagem passa por uma situação que, segundo o narrador, ela própria chama de “crise”:

“O que chamava de crise viera afinal. E sua marca era o prazer intenso com que olhava agora as coisas, sofrendo espantada. O calor se tornara mais abafado, tudo tinha ganho uma força e vozes mais altas.”

(Clarice Lispector, Laços de Família. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p.23.)

Essa crise, que transforma a relação da personagem com o mundo e com a família,

  • a

    nasce do colapso da vontade de viver da personagem, em razão do doloroso prazer com que passou a ver as coisas. 

  • b

    revela o conflito vivido pela personagem entre o tipo de vida que havia escolhido e as coisas que passou a desejar. 

  • c

    constitui, para a personagem, uma alteração no modo de vida que antes a fazia sofrer e do qual agora havia se libertado.

  • d

    remete à excitação da personagem por ter conseguido harmonizar sua antiga vida com os novos desejos e sensações.

Ana, mulher casada e mãe, vive imersa nas convenções sociais, vendo nelas um princípio de organização. Ao deparar com um cego mascando chiclete, sente que essa ordem foi fraturada. Estabelece-se, a partir daí, uma crise na personagem, uma transformação que se refletirá na forma de olhar para si mesma e para sua atuação no mundo. Ana passa a questionar a noção de felicidade e de realização pessoal.