Você é integrante de um coletivo que defende a igualdade de gênero. Após ler matérias sobre a aprovação de leis que afetam diretamente as mulheres, você constatou que tais leis são elaboradas por um Parlamento majoritariamente masculino. Então decidiu mobilizar suas/seus colegas do coletivo para articular, por meio de iniciativa popular, um Projeto de Lei (PL) que estabeleça igualdade de gêneros nas cadeiras do Congresso Nacional. Você ficou responsável por escrever o texto de apresentação desse PL, o qual será lido na Câmara dos Deputados. Em seu texto, você deve destacar: a) malefícios que a desigualdade de gênero no Parlamento tem gerado na sociedade brasileira; e b) argumentos que comprovam que uma representação política mais igualitária pode levar a um cenário de maior justiça social no país. Você deve, obrigatoriamente, apropriar-se de elementos da coletânea a seguir, demonstrando leitura crítica dela na elaboração de seu próprio texto.
Glossário:
Coletivo: conjunto de pessoas reunidas em prol de um mesmo objetivo: político, social ou artístico.
Iniciativa Popular: consiste na apresentação de um Projeto de Lei à Câmara dos Deputados, assinado por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído por pelo menos cinco estados, com até 0,3% dos eleitores de cada um deles.
1. Maioria no Congresso Nacional, os parlamentares homens são os principais responsáveis por 74% dos projetos desfavoráveis aos direitos das mulheres. Uma em cada quatro propostas sobre gênero no Congresso prejudica as mulheres de alguma forma. O levantamento do “Elas no Congresso”, de 2020, feito pela revista AzMina, avaliou 331 Projetos de Lei (PL). Os temas mais abordados foram gênero, aborto, cotas na política e violência doméstica. A doutoranda em Ciência Política da USP, Beatriz Rodrigues Sanchez, acredita que, devido a essa formação assimétrica do Congresso, os valores e a visão dos homens prevalecem, dificultando a instauração de políticas afirmativas e de maior visibilidade à pauta feminina: “Os homens brancos, heterossexuais, empresários e ruralistas ocupam a maior parte das cadeiras no Congresso Nacional”.
(Adaptado de OLIVEIRA, Kaynã de. “Machismo estrutural no legislativo não enxerga interesses das mulheres”. Jornal da USP, 21/05/2021.)
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4. Aprovada por unanimidade na Câmara e no Senado mexicanos, a Reforma Constitucional de 2019 definiu que a busca pela paridade de gênero alcançaria os três poderes e organismos públicos autônomos, como o Banco do México e o Instituto Nacional de Estatística e Geografia. O avanço entre a Reforma de 2014 – que definiu a paridade no Legislativo – e a de 2019 foi possível porque já havia uma paridade no Congresso no momento dessa segunda votação, e, portanto, havia um expressivo número de mulheres parlamentares eleitas que então pressionaram pelo equilíbrio também no Executivo e no Judiciário.
(Adaptado de BIANCONI, Giulliana et al. “Lei de paridade de gênero no México mostra caminho para nova política”. Gênero e Número, 22/08/2022.)
5. Está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL 1904/24) que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples. Caso aprovado, uma mulher vítima de estupro que interrompa a gravidez pode ter pena maior do que a do estuprador. A pena para homicídio simples – definido pelo Código Penal como o crime praticado quando se mata alguém – varia de 6 a 20 anos de prisão. Já a pena para o estupro varia de 6 a 10 anos, podendo chegar a 12 anos se a vítima tiver entre 14 a 17 anos, destaca a advogada Flávia Pinto Ribeiro, presidente da OAB Mulher Rio de Janeiro.
(Adaptado de SCHROEDER, Lucas; SOUZA, Renata. “Mulher vítima de estupro pode ter pena maior que estuprador em caso de aborto, segundo projeto”. CNN Brasil, Política, 13/06/2024.)
6. A deputada Soraya Santos ressalta que a importância da presença feminina na política vai muito além de discutir temas associados a mulheres. Para a parlamentar, a participação das mulheres se faz necessária para a discussão de pautas mais abrangentes, como violência contra crianças e adolescentes, educação ou saúde. Soraya Santos chama atenção também para uma outra forma de violência política, aquela presente nas estruturas partidárias, que sabotam as candidaturas femininas a cargos eletivos. Embora a legislação obrigue os partidos a reservar no mínimo 30% das candidaturas para mulheres nas eleições para a Câmara dos Deputados, assembleias legislativas e câmaras de vereadores, até muito recentemente, a prática mais comum, conforme explica a deputada, era a apresentação das chamadas candidaturas “laranja”, uma maneira de burlar a lei. Nas eleições municipais de 2016, mais de 14 mil mulheres tiveram zero voto, muitas delas sequer sabiam que o seu CPF contava para a chapa, exemplifica Soraya Santos.
(Adaptado de “Bancada feminina conseguiu aprovar 43 leis desde o início da legislatura, em 2023”. Rádio Câmara, 08/03/2024.)
Nesta proposta, o vestibular da Unicamp requisitou a elaboração de um texto de apresentação de um Projeto de Lei (PL) que visa garantir a paridade de gênero nas cadeiras do Congresso Nacional. No texto, os candidatos deveriam apontar os malefícios que a desigualdade de gênero no Parlamento tem causado à sociedade brasileira e defender como uma representação mais igualitária pode gerar maior justiça social. Trata-se de uma proposta alinhada com a tradição de anos anteriores, com temática atual e pertinente.
Na situação proposta, o candidato assume o papel de um ativista engajado na luta pela igualdade de gênero, integrante de um coletivo que busca provocar mudanças significativas no cenário político. O texto exige uma linguagem formal e um caráter argumentativo, recursos adequados ao propósito de sensibilizar parlamentares e a sociedade civil. Além disso, o contexto político e a natureza da audiência (um público parlamentar) pedem argumentos sólidos e fundamentados.
A coletânea textual é composta por cinco textos. O Texto 1 apresenta dados sobre a desproporção de gênero no Congresso e os impactos negativos dessa desigualdade, como a maior proporção de parlamentares homens apoiando projetos contrários aos direitos das mulheres. O Texto 2 destaca a discrepância entre a composição demográfica do país e a do Congresso, reforçando a necessidade de medidas para corrigir essa distorção. O Texto 3 mostra como a experiência mexicana de paridade legislativa resultou em avanços significativos nos três poderes, servindo de exemplo para o Brasil. O Texto 4 evidencia como a predominância masculina no Congresso favorece propostas que impactam negativamente as mulheres, como o PL que criminaliza o aborto em casos extremos. O Texto 5 enfatiza a importância de mulheres na política para enriquecer o debate em diversas áreas e denuncia práticas que limitam sua participação, como candidaturas laranjas.
Para abordar o propósito “a”, sobre os malefícios da desigualdade, os candidatos poderiam citar dados do Texto 1 para argumentar que a desproporção de gênero resulta em legislações desfavoráveis às mulheres. Isso seria enriquecido com o Texto 4, para exemplificar os impactos concretos dessas políticas.
A fim de abordar o propósito “b”, de defender os benefícios da paridade, uma possibilidade é o uso do Texto 3, que trata da experiência do México, a qual pode ser usada como exemplo por se tratar de um outro país em desenvolvimento do continente americano. A utilização do Texto 5 também poderia ser feita para argumentar que a presença feminina enriquece o debate político em temas diversos.
Também era possível valer-se de repertório cultural próprio, desde que pertinente à proposta e aos propósitos da apresentação.