Texto I

1) Examine o cartum

Texto II

Brasil tem mais templos religiosos do que hospitais e escolas somados

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou, no Censo 2022, que o Brasil tem mais templos religiosos do que hospitais e escolas somados. O cálculo foi feito após registro de 111 milhões de endereços ao redor do país. A pesquisa, divulgada nesta sexta-feira (2), registrou 579,7 mil estabelecimentos religiosos, uma média de 286 igrejas por 100 mil habitantes.

Em contrapartida, há 264,4 mil instituições de ensino no Brasil e 247,5 mil hospitais. Quando somam-se os dados, existem quase 512 mil estabelecimentos, mais de 60 mil a menos.

O Acre é o estado com a maior proporção, tendo 554 igrejas para cada 100 mil habitantes. Nesse sentido, a Região Norte lidera o ranking, com 79.650 templos religiosos em todos os sete estados, o que dá 485 por 100 mil habitantes. Por outro lado, o Sul, a menor região do país, apresenta um índice menor que a metade, com 226 para cada 100 mil. De todas as 27 unidades federativas, apenas Paraná, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo possuem mais instituições de ensino e saúde do que religiosas.

De acordo com um estudo do cientista político do Centro de Estudos da Metrópole, Victor Araújo, o número de igrejas evangélicas entre 2015 e 2019 quintuplicou no Brasil, de cerca de 20 mil, para 109,5 mil. Quase metade delas são pentecostais (48.781 templos).

Uma das razões, segundo Victor, é o enfraquecimento do catolicismo nas periferias. “Eram populações católicas, mas as paróquias não estavam nesses locais, e eles foram rapidamente ocupados pelas evangélicas, que têm estruturas menos engessadas, às quais a cultura das periferias se adaptou melhor”, disse o especialista ao Estadão.

Tomaz Belluomini, https://www.terra.com.br/noticias/, 02/02/2024. Adaptado.

Texto III

Pesquisadores criticam comparação de número de igrejas e escolas

Pesquisadores consideram relativo o fato de o Brasil ter mais estabelecimentos religiosos que escolas e hospitais e questionam comparações feitas com base nesses dados, que foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no início deste mês.

O levantamento, que faz parte do Censo 2022, apresenta um mapeamento de 111,1 milhões de estabelecimentos no território brasileiro. Destes, 579,8 mil são relativos a finalidades religiosas, independentemente de qual seja a crença. Isso inclui igrejas, sinagogas, templos, centros espíritas e terreiros, por exemplo. Os estabelecimentos de ensino somam 264,4 mil localizações, e os de saúde, 247,5 mil endereços. O consolidado desses dados forma o Cadastro Nacional de Endereços para Fins Estatísticos (Cnefe).

O detalhamento considera a destinação final do imóvel, e não a administração do estabelecimento. Por exemplo, uma escola católica é registrada como uma unidade de educação, e não como localização religiosa. O mesmo vale para um hospital mantido por santa casa, que é contabilizado como endereço com atividade de saúde.

O professor Matheus Cavalcanti Pestana, da Escola de Comunicação, Mídia e Informação da Fundação Getulio Vargas (FGV), considera “alarmante” haver comparação apenas numérica. “São coisas incomparáveis justamente por atenderem públicos com focos diferentes, terem estruturas distintas.

O indivíduo que vai à igreja também é atendido no hospital, estudou na escola.” Pestana acrescenta que, mesmo se os dados fossem comparáveis, a conclusão não acrescentaria muita coisa. “Imagine uma comparação: no município X, temos mais escolas particulares que públicas. Mas quantos alunos são atendidos pelas particulares? Quantos pelas públicas? A dimensão da pública é muito maior”, justifica.

Pesquisador associado no Instituto de Estudos da Religião (Iser), Pestana diz que comparações que levem ao entendimento de que há muitas igrejas no país revelam algum grau de preconceito religioso. “Foi perceptível, entre diversos comentaristas, que houve uma associação do ‘alto número de estabelecimentos religiosos’ com o fato de ‘a maioria desses locais ser composta por templos evangélicos’. Isso nunca foi dito”, critica o professor. Ele reconhece que outras pesquisas mostram, por exemplo, crescimento no número de igrejas evangélicas e ressalta que esta não é uma constatação do Censo.

Além disso, o professor observa que o IBGE não identifica a vinculação religiosa dos estabelecimentos. “Pode ser uma catedral católica que atende a milhares de fiéis, ou uma igreja evangélica que recebe dez pessoas, ou um terreiro de candomblé que está ali presente há gerações, ou um centro espírita”.

Ele destaca, ainda, que o Brasil é um país religioso, com formação religiosa plural e coexistência de diversos credos, o que deve ser um combustível para tolerância religiosa. “A tolerância é algo que deve existir não só entre as religiões, mas também dos segmentos não religiosos”, afirma.

Por fim, o professor acrescenta que também não cabe fazer comparações com outros países. “Cada local tem sua forma de desenvolvimento. Mas é absolutamente normal o Brasil ter mais igrejas do que escolas e hospitais.”

Bruno de Freitas Moura, https://agenciabrasil.ebc.com.br/, 17/02/2024. Adaptado

Com base nos textos aqui reproduzidos, bem como em outras informações que considere pertinentes, redija uma dissertação em prosa, argumentando de modo a expor seu ponto de vista sobre o tema: O que o fato de o Brasil possuir mais igrejas que escolas e hospitais somados pode nos dizer sobre o País?

Instruções:

• A redação deverá seguir as normas da língua escrita culta e deverá ser redigida com letra legível e, obrigatoriamente, com caneta esferográfica de tinta azul ou preta, sendo vedado o uso de lápis, lapiseira (grafite), caneta hidrográfica fluorescente, corretor líquido e/ou borracha. Redações que não seguirem essas instruções não serão corrigidas, recebendo, portanto, nota zero.

• O espaço para rascunho não será considerado para fins de correção. É obrigatório transcrever a redação na folha definitiva.

• O texto da redação deverá ter, no mínimo, 20 e, no máximo, 30 linhas escritas. Redações fora desses limites não serão corrigidas e receberão nota zero.

• A redação terá nota zero, caso haja fuga total ao tema ou à estrutura definidos na proposta apresentada.

• É recomendável dar um título a sua redação.

Como é tradição nos exames de redação da FGV, a banca solicitou aos candidatos a elaboração de um texto dissertativo-argumentativo em prosa. Neste ano, os candidatos foram convidados a fazer uma reflexão em que fosse revelado o seu posicionamento sobre um tema bastante pertinente e atual:  O que o fato de o Brasil possuir mais igrejas que escolas e hospitais somados pode nos dizer sobre o País?

Para apoiar a análise acerca do tema, foram fornecidos três textos motivadores, os quais eram bastante informativos e esclarecedores sobre a questão posta em debate, para que o aluno conseguisse elaborar seu posicionamento frente ao tema.

No texto 1, a charge de Jean Galvão, publicada na Folha de São Paulo, é uma referência direta à notícia do censo 2024: “Brasil tem mais igrejas e templos do que locais de saúde e educação”.

Em um primeiro momento, o médico, no hospital, diz ao paciente seu diagnóstico: apenas um resfriado.

No segundo quadrinho, notamos um funcionário retirando a placa do hospital.

Por fim, o hospital se torna um lugar religioso (simbolizado pela troca da cruz vermelha símbolo da área médica por uma cruz cristã), o médico se torna o padre; e o diagnóstico não se baseia mais em evidências científicas: agora, a gripe se tornou o demônio no corpo.

Como interpretação, o candidato poderia indicar a mudança do paradigma saúde tratada como ciência para ser encarada como problemas subjetivos e individuais, que encontram soluções mais simples em crenças pessoais e não na melhora da saúde coletiva.  

O texto 2, escrito por Tomaz Belluomini, apresenta dados absolutos da pesquisa do Censo 2022: O Brasil registrou 579,7 mil estabelecimentos religiosos; contra 264,4 mil instituições de ensino no Brasil e 247,5 mil hospitais.

Os dados do IBGE apontam, ainda, para a distribuição desigual de templos nas regiões do país: há predominância de igrejas na Região Norte e menor quantidade delas na Região Sul.

O excerto também mostra uma explicação interessante para o fenômeno a partir da pesquisa de Victor Araújo: de 2015 a 2019 as instituições religiosas quintuplicaram, com aumento das pentecostais, sobretudo nas periferias, onde a igreja católica perdeu espaço.

O texto 3, de Bruno de Freitas Moura, denominado “Pesquisadores criticam comparação de número de igrejas e escola” apresenta pontos de vista que questionam os dados absolutos do IBGE:

Matheus Cavalcanti (FGV) alerta que a comparação numérica pode ser injusta, visto que os locais servem com funcionalidades diferentes.

Pestana, pesquisador do Instituto de Estudo da Religião (Iser), afirma que as comparações que levem ao entendimento de que há muitas igrejas no país revelam preconceito religioso. Segundo ele, o IBGE não identifica a vinculação religiosa dos estabelecimentos, especificando de qual doutrina pertence. Além disso, ele frisa que não é possível comparar a realidade de cada país em números absolutos de cada instituição.

Encaminhamentos possíveis

Para desenvolver a análise, o candidato poderia aproveitar dados e ideias da coletânea, bem como lançar mão de conhecimentos pessoais a respeito da questão. A partir do tema (“O que o fato de o Brasil possuir mais igrejas que escolas e hospitais somados pode nos dizer sobre o País?”), era possível que o candidato adotasse alguns caminhos, a citar:

Causas

O Brasil não respeita os Direitos Constitucionais:

Segundo o art. 19 da Constituição Federal, o Brasil é laico, ou seja, o Estado deve assegurar liberdade de crença e culto religioso e ser neutro em relação às questões religiosas; porém, segundo o artigo 150 da mesma lei, igrejas, entidades religiosas e “templos de qualquer culto” são isentos de pagar impostos. Ainda segundo a Carta Magna, a educação é “direito de todos e dever do Estado e da família” (art.205); e a saúde é “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas” (art. 196).  

Portanto, os direitos constitucionais como saúde e educação deveriam ser assuntos prioritários em um país laico.

O Brasil não prioriza investimentos de seguridade social:

As nações que não investem em escolas e hospitais, como o Brasil, apresentam serviços públicos de educação e saúde de baixa qualidade, principalmente para a população mais vulnerável. O discurso religioso pode servir, ainda, para tentar justificar desigualdades sociais que o Estado deveria combater. Assim, a presença dos templos, especialmente nas periferias, como aponta o texto 2, indica que as igrejas assumem, muitas vezes, a função de seguridade social que deveria ser garantida pelo Estado.

O Brasil prioriza uma política de interesses individuais:

Apesar do caráter laico do Brasil, líderes e grupos religiosos, muitas vezes, exercem influência significativa na política e nas decisões governamentais. Isso pode ser visto na formação de bancadas religiosas no Congresso e na atuação de políticos religiosos.

Consequências

Possíveis conflitos entre saúde e religião:

Com forte presença religiosa, as decisões médicas podem ser influenciadas por crenças individuais em vez de serem baseadas em evidências científicas, como indica o texto 1. Isso pode comprometer a qualidade e a eficácia dos cuidados médicos, além da liberdade de escolha dos pacientes. Ademais, os serviços de saúde, sob influência religiosa, podem impor restrições, o que pode afetar negativamente a saúde dos indivíduos.

Possíveis conflitos entre escola e religião:

É importante que as instituições de ensino sejam laicas, visto que o ambiente escolar que favorece apenas uma religião pode fomentar a intolerância contra estudantes de outras crenças, criando um ambiente hostil e segregado. As disciplinas contrárias às doutrinas religiosas podem, também, sofrer censuras, o que limitaria determinados debates fundamentais em respeito à diversidade e à construção da cidadania.

Manutenção de privilégios sociais:

A falta de investimento em saúde, educação e o incentivo de instituições religiosas pode resultar na falta de senso crítico, do incentivo ao método científico, da diversidade. Isso pode afetar negativamente o bem-estar e os direitos constitucionais dos brasileiros.

É claro que o candidato poderia ter apresentado outros encaminhamentos para a defesa de seu ponto de vista, mas talvez esses sejam principais e que, inclusive, fornecem embasamento para outras visões, que podem se desdobrar a partir desses argumentos centrais.

Por fim, cabe destacar que o candidato que estudou a prova da FGV de 2023, cujo tema foi “A laicidade do Estado brasileiro contemporâneo”, provavelmente saberia como desenvolver a questão. Isso mostra como conhecer os temas anteriores pode auxiliar na reflexão do tema.