Leia o texto para responder à questão.

“A Dinamarca vai devolver ao Brasil um manto tupinambá que está em Copenhague desde pelo menos 1699. A peça, considerada extremamente rara, será doada para o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, pelo Museu Nacional da Dinamarca. O manto é feito de penas vermelhas de guará. Artista, Glicéria Tupinambá está completando sua formação em antropologia no Museu Nacional e vem realizando um trabalho de encontro e pesquisa dos mantos e outros artefatos de seus ancestrais junto às instituições europeias. Em 2006, Glicéria estava trabalhando na composição de um novo manto tupinambá como forma de agradecimento a entidades sagradas, os Encantados, pelo processo de retomada do território indígena. Por meio de fotos, ela vinha tentando entender a técnica para fazer a trama dos mantos da mesma forma que era feita por seus antepassados. ‘Eu fui entendendo a questão do ponto, que é o ponto do jereré, que as mulheres tupinambá utilizam para fazer instrumentos de pesca. Só duas mulheres sabiam fazer esse ponto na aldeia, minha madrinha de 97 anos e minha prima de 78 anos. Mulheres detentoras de um saber que está quase extinto’, conta ela. O primeiro manto que Glicéria teve oportunidade de conhecer pessoalmente está — ainda — na França. ‘Eu quero ver o avesso’, disse ela à equipe do museu parisiense, em 2018. ‘O pessoal fica muito ligado na cor da pena, mas eu queria entender a malha, a técnica, ver o avesso’. Mas não só isso. Glicéria também queria escutar o manto. ‘O manto fala comigo. A gente tem uma relação ancestral’, explica ela. ‘Sei que para quem passou a vida inteira ouvindo que objetos não falam, eu pareço uma pessoa louca. Mas eu venho de um contexto de aldeia, e a gente entende que os objetos não são simplesmente objetos, ainda mais quando se tratam de vestimentas usadas no ambiente religioso’. Glicéria conta que, na ocasião, o manto mostrou a ela três imagens: ‘Uma quando ele estava dentro do território, eu via mulheres, crianças, as penas, a feitura. Outra imagem que ele me apresenta era ele dentro de uma embarcação, as pessoas na margem. Eu podia sentir a areia nos meus pés e ver a embarcação sumindo no fio do horizonte. E, depois, eu vejo esse manto saindo da embarcação e desaparecendo por uma viela escura’.”

Isabel Seta. Raríssimo manto tupinambá que está na Dinamarca será devolvido ao Brasil; peça vai ficar no Museu Nacional. 28/06/2023. Disponível em:
https://g1.globo.com/. 

a) Justifique o uso de "ainda" no trecho "O primeiro manto que Glicéria teve oportunidade de conhecer pessoalmente está — ainda — na França.". Reescreva a frase, substituindo apenas a palavra "ainda", sem prejuízo do sentido.

b) Explique o sentido do trecho "os objetos não são simplesmente objetos" no texto.

a) O emprego do “ainda” sugere no trecho que o manto deixará de estar na França em algum momento, para retornar ao Brasil. Trata-se de uma palavra que alimenta uma expectativa em relação ao futuro. Uma possibilidade de reescritura, sem prejuízo do sentido, seria: O primeiro manto que Glicéria teve oportunidade de conhecer pessoalmente está — até agora — na França.

Obs.: outras expressões poderiam substituir o advérbio “ainda”, sem prejuízo de sentido, tais como “por enquanto”, “até o momento”, ou “por ora”.

b) Para os tupinambás, o manto tem um significado que vai além do valor etnográfico. Não se trata de um mero objeto para ser exposto num museu, mas num artefato que dialoga com uma cultura ancestral e tem importante significado religioso. Assim, quando Glicéria Tupinambá afirma que “queria escutar o manto”, ela queria compreender os valores, as tradições, os significados, as imagens que o manto suscitava para ela, dentro do contexto da cultura tupinambá.