Texto 1

As doenças tropicais negligenciadas (DTN) são aquelas causadas por agentes infecciosos ou parasitas e consideradas endêmicas em populações de baixa renda. Essas enfermidades também apresentam investimentos reduzidos em pesquisas, produção de medicamentos e em seu controle. As doenças tropicais, como malária, doença de Chagas, tripanossomíase humana africana (doença do sono), leishmaniose, dengue e esquistossomose, continuam sendo algumas das principais causas de adoecimento e mortalidade em todo o mundo. Esses males incapacitam ou matam milhões de pessoas e representam uma necessidade médica importante que permanece não atendida.

(Ricardo Valverde. “Doenças negligenciadas”. https://agencia.fiocruz.br. Adaptado.)

Texto 2

Cerca de um bilhão de pessoas no mundo são afetadas pelas chamadas doenças negligenciadas: enfermidades que a indústria farmacêutica não tem interesse em pesquisar, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). O motivo? “Elas estão relacionadas à pobreza, então não têm muito interesse para o mercado, porque não dão um retorno lucrativo”, explica Sinval Brandão, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT).

A falta de interesse da indústria farmacêutica faz com que essas doenças tenham tratamentos muito antigos, com limitações, baixa eficácia e reações adversas, explica Jadel Katz, gerente de pesquisa e desenvolvimento da Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi). Ethel Maciel, epidemiologista da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), acrescenta que a dificuldade não é só para tratamentos, mas também em prevenção e diagnóstico. Assim, praticamente toda a pesquisa e o desenvolvimento são feitos pelo setor público ou por instituições sem fins lucrativos, principalmente estrangeiras. Porém, mesmo que o Estado e a academia invistam em pesquisa, o avanço é muito mais difícil sem a infraestrutura da indústria, principalmente na criação de tratamentos e na fabricação de remédios.

(Letícia Mori. “As doenças negligenciadas pela indústria farmacêutica que afetam milhões de pessoas no mundo e no Brasil”.
www.bbc.com, 31.01.2019. Adaptado.)

Texto 3

A quantia disponível para investimentos em pesquisas feitas por instituições públicas sobre doenças tropicais negligenciadas (DTN), entre as quais estão a dengue e a malária, não teve aumento entre 2004 e 2020, concluiu um estudo brasileiro publicado em março de 2023. O montante sofreu uma pequena redução durante os anos, mas, por ser uma redução baixa, os autores dizem que o investimento estacionou. A estagnação preocupa, na avaliação de Gabriela Melo, doutoranda do programa de pós-graduação em ciências e tecnologias em saúde da Universidade de Brasília (UnB): “as DTN continuam afetando a população, especialmente as pessoas que vivem em situações vulneráveis, com, por exemplo, acesso inadequado a saneamento básico, saúde e educação”.

O Brasil é um país bastante afetado por essas enfermidades. Algumas têm um impacto menor, porém outras representam sérios riscos. Para Melo, o cenário não é o melhor de todos. “Seria interessante termos uma política de Estado consolidada, com o objetivo de garantir o avanço da ciência em prol da melhoria da qualidade de vida da população brasileira e o enfrentamento das doenças tropicais negligenciadas”.

A visão do médico sanitarista e professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Gonzalo Vecina, é parecida. Segundo ele, de todo o rol das doenças tropicais negligenciadas, somente a dengue teve um planejamento público de pesquisa mais direcionado no Brasil — no caso, o desenvolvimento de uma vacina no Instituto Butantan que se encontra em estágio avançado dos testes em humanos.

(Samuel Fernandes. “Verba para pesquisas de doenças como dengue e malária não avança no Brasil desde 2004”.
www.folha.uol.com.br, 16.03.2023. Adaptado.)

Com base nos textos apresentados e em seus próprios conhecimentos, escreva um texto dissertativo-argumentativo, empregando a norma-padrão da língua portuguesa, sobre o tema:

Doenças tropicais negligenciadas:
a quem cabe investir em pesquisas para combatê-las?

A prova de redação da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (Santa Casa), como em anos anteriores, requisitou a elaboração de um texto dissertativo-argumentativo sobre uma questão relevante e polêmica da atualidade. No entanto, o tema não seguiu a tradição das provas de redação da Fundação Vunesp de abordar a questão a partir de um recorte de polarização, e na atual edição, os candidatos e candidatas deveriam produzir um texto sobre o tema “Doenças tropicais negligenciadas: a quem cabe o incentivo à pesquisa para combatê-las?”.

A fim de que o aluno pudesse refletir sobre o tema proposto, a coletânea ofereceu três textos de apoio. O primeiro, publicado pela Fiocruz, trouxe não apenas a definição sobre o que são as doenças tropicais negligenciadas, como também já deixa claro que tais enfermidades são assim classificadas pelo fato de não serem foco de investimentos em pesquisas para o seu combate; junto a isso, ainda foram citados, neste excerto, alguns exemplos dessas doenças.

O segundo texto, de autoria da jornalista Letícia Mori, traz a quantidade de pessoas, ao redor do mundo, que são afetadas por essas doenças tropicais, e, também, explicita o motivo principal pelo qual quase não existem investimentos, por parte da indústria farmacêutica, em pesquisas, prevenção e diagnóstico: estão relacionadas à pobreza; logo, por não darem retorno lucrativo e serem estigmatizadas, não são de interesse do mercado. É por isso que, segundo o texto, as pessoas que sofrem com essas doenças ficam sujeitas a tratamentos limitados, antigos e de baixa eficácia.

Por fim, o terceiro texto, publicado na Folha de S. Paulo, traz informações mais concretas sobre essa negligência ao afirmar que os investimentos em pesquisas voltadas ao combate, tratamento e prevenção dessas doenças tropicais não só são baixos, como sofreram uma queda nos últimos anos. Trata-se de uma situação preocupante, principalmente quando se leva em consideração que a população mais vulnerável é quem sofre com essas doenças, pois é a mais atingida por falta de saneamento básico, educação e saúde. De acordo com os especialistas citados neste excerto, o Brasil é um dos países mais impactados por esse problema, e devido a isso, cabe ao Estado a função de investir em políticas consolidadas que objetivem garantir o avanço da ciência em prol da qualidade de vida da parcela mais vulnerável, bem como propiciar o enfrentamento das doenças tropicais negligenciadas.

ENCAMINHAMENTOS POSSÍVEIS

Levando-se em consideração as ideias trazidas pela coletânea, é possível pensar em dois grandes responsáveis pelos investimentos no incentivo à pesquisa de combate às doenças tropicais negligenciadas: as indústrias farmacêuticas e o próprio Estado. Nesse sentido, o aluno poderia, portanto, adotar três principais posicionamentos:

(a) Cabe ao Estado o incentivo à pesquisa pelo fato de o setor público ser o responsável por mais financiar pesquisas em um país, especialmente quando direcionadas às universidades públicas – grandes fomentadoras e desenvolvedoras de pesquisas e tecnologias em geral;

(b) Cabe às indústrias farmacêuticas a responsabilidade no investimento e desenvolvimento de pesquisas no combate a essas doenças tropicais, já que são agentes importantes no que tange a inovações e tratamentos;

(c) É essencial que haja uma parceria público-privada, a fim de que as universidades (financiadas pelo Estado) consigam realizar as pesquisas de base que servem como esteio para a criação e aplicação de tratamentos por parte das indústrias farmacêuticas – visto que possuem mais dinheiro, estrutura e tecnologia.

O mais importante, independente do encaminhamento adotado pelo aluno, era a sustentação, a partir de argumentação analítica e consistente, do posicionamento escolhido. Isso poderia ser feito, naturalmente, a partir de repertório sociocultural próprio do candidato, mas também era permitida a retirada de informações da coletânea – como exemplos, argumentos de autoridade, dados numéricos e análises –, já que os textos forneciam bastante subsídio para fundamentação do ponto de vista.