Texto 1:
As últimas décadas vêm sendo marcadas por diversas crises humanitárias a acometer diversas partes do globo, sejam elas guerras, desastres naturais ou doenças. Tais crises acabam por ser responsáveis por uma das situações mais graves, complexas e urgentes a serem solucionadas no mundo, que é a crise de refugiados, um dos maiores desafios da história recente. Apesar de as guerras e conflitos terem ganhado certo destaque e relevância como os grandes agentes causadores de tal fenômeno, esses fatores, apesar de importantes, não formam a principal causa de grande parte do êxodo de refugiados. Ao contrário do senso comum, grande parte dos deslocamentos forçados e refúgios no mundo se dão por desastres naturais como alagamentos, terremotos, vulcões ou ciclones.
https://aun.webhostusp.sti.usp.br/. Adaptado.
Texto 2:
Texto 3:
Texto 4:
Aproximavam-se agora dos lugares habitados, haveriam de achar morada. Não andariam sempre à toa, como ciganos. O vaqueiro ensombrava-se com a ideia de que se dirigia a terras onde talvez não houvesse gado para tratar. Sinhá Vitória tentou sossegá-lo dizendo que ele poderia entregar-se a outras ocupações, e Fabiano estremeceu, voltou-se, estirou os olhos em direção à fazenda abandonada. Recordou-se dos animais feridos e logo afastou a lembrança. Que fazia ali virado para trás?
Vidas Secas. Graciliano Ramos.
Texto 5:
Um relatório do Banco Mundial projeta que até o ano de 2050 poderá haver mais de 17 milhões de latino-americanos (2,6% dos habitantes da região ou o equivalente à população do Equador) deslocados pela mudança climática se não forem tomadas medidas concretas para frear seus efeitos. “Os migrantes climáticos se deslocarão de áreas menos viáveis, com pouco acesso à água e produtividade de cultivos, e de áreas afetadas pela elevação do nível do mar e pelas marés de tempestade”, diz o documento. As áreas que sofrerão o golpe mais duro, acrescenta, são as mais pobres e vulneráveis.
https://brasil.elpais.com/internacional/.
Texto 6:
Somos alertados o tempo todo para as consequências das escolhas recentes que fizemos. E se pudermos dar atenção a alguma visão que escape a essa cegueira que estamos vivendo no mundo todo, talvez ela possa abrir nossa mente para alguma cooperação entre os povos, não para salvar os outros, para salvar a nós mesmos.
Ideias para adiar o fim do mundo. Aílton Krenak. Adaptado.
Considerando as ideias apresentadas nos textos e também outras informações que julgar pertinentes, redija uma dissertação em prosa, na qual você exponha seu ponto de vista sobre o tema: Refugiados ambientais e vulnerabilidade social.
Instruções:
• A dissertação deve ser redigida de acordo com a norma padrão da língua portuguesa.
• Escreva, no mínimo, 20 linhas, com letra legível e não ultrapasse o espaço de 30 linhas da folha de redação.
• Dê um título a sua redação.
Análise da proposta
A proposta de redação da Fuvest desta edição requisitou a elaboração de uma dissertação sobre o tema “Refugiados ambientais e vulnerabilidade social”. Embora a banca tenha seguido a tradição de abordar uma questão relevante para a compreensão do mundo contemporâneo, o recorte temático nesse caso teve um caráter mais social e concreto em relação a edições anteriores.
A coletânea textual da proposta é composta por seis textos. O texto 1, trecho de uma reportagem da Agência Universitária de Notícias, aborda a crise dos refugiados no mundo como uma das mais graves existentes e a associa a desastres naturais. O Texto 2, um infográfico do portal G1, indica que há uma ocorrência maior de refugiados climáticos em regiões mais pobres do globo. O Texto 3, uma fotografia da obra “Êxodos”, do brasileiro Sebastião Salgado, ilustra a condição de refugiados como pessoas que vivem com recursos econômicos mínimos. O texto 4, excerto do romance “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, retrata a insegurança de retirantes nordestinos frente às mudanças que teriam que vivenciar com sua migração forçada. O Texto 5, parte de uma reportagem do El País, traz dados sobre o aumento dos migrantes climáticos na América Latina, e de como os mais atingidos são os mais pobres e vulneráveis. O Texto 6, do filósofo indígena brasileiro Aílton Krenak, alerta para a necessidade de uma nova visão de cooperação para que possamos salvar a nós mesmos diante dos efeitos das nossas próprias escolhas.
Encaminhamentos possíveis
Para abordar o tema, é necessário definir recortes de análise para o problema que possam relacionar o fenômeno dos refugiados ambientais à condição de vulnerabilidade social. Nesse sentido, o tema e os textos de apoio devem ser tomados como pontos de partida para a mobilização de um repertório cultural relacionado ao tema e que contribua para a construção de uma visão crítica a respeito dele.
Entre outros, poderiam ser desenvolvidos os seguintes encaminhamentos:
- Analisar as causas ambientais do problema, articuladas com o modo de vida capitalista moderno. O fenômeno dos refugiados ambientais pode ser relacionado à degradação ambiental, sobretudo no que diz respeito às alterações climáticas provocadas pelas ações humanas desde a Revolução Industrial. Nesse sentido, pode-se falar do sistema econômico como causa do problema, já que a industrialização e o consumismo aumentaram de forma significativa o impacto de ações humanas sobre o meio ambiente. O texto de Krenak poderia ser relacionado com essa questão, ao abordar a necessidade de buscarmos novas visões que nos salvem de consequências de nossas próprias escolhas;
- O sociólogo Zygmunt Bauman poderia ser mencionado na sua leitura de que vivemos em uma sociedade de consumidores voltada à compra de produtos fúteis e descartáveis, com predomínio de um pensamento individualista. Esse modo de vida é uma das causas da falta de sustentabilidade do desenvolvimento econômico no mundo contemporâneo;
- Analisar as causas e implicações sociais do problema. As populações forçadas a emigrar por razões ambientais, como aponta o próprio enunciado do tema, vivem, muitas vezes, em vulnerabilidade social. Nesse sentido, cabe destacar o caráter desigual da globalização, que vem levando a um aumento na concentração de renda e a uma exposição de uma grande massa de indivíduos a uma precarização ainda maior de suas condições de vida, conforme indicam os dados dos textos 2 e 5. Os refugiados retratados por Salgado e os personagens de "Vidas secas" representam bem essa situação de busca por uma vida mais digna;
- Apontar a injustiça e a contradição existentes no fato de que as mudanças climáticas foram aceleradas principalmente por conta do desenvolvimento econômico das regiões mais ricas, enquanto os efeitos delas são sofridos justamente pelas populações de regiões que não contribuíram tanto para o problema;
- Mobilizar o conceito de necropolítica, de Achille Mbembe, para a discussão. De acordo com ele, o Estado moderno opera de modo a deixar parte das suas populações em situações que pode levá-las à morte, enquanto outros têm seu direito à vida digna protegido. Haveria, então, uma parcela da população “matável”, definida sobretudo a partir de critérios raciais. Os refugiados ambientais seriam um exemplo desse grupo no mundo global;
- Empregar o conceito de racismo ambiental na discussão. Afinal, ele aponta para a distribuição desigual dos riscos ambientais de acordo com o perfil étnico-racial de diferentes grupos. Como a população mais atingida é não branca, essa abordagem do problema seria válida.