Leia o poema e responda à questão:

Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque, quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida e já cobrada,
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história,

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

 Gregório de Matos

Neste conhecido soneto de Gregório de Matos, o eu lírico, visando ao convencimento de seu interlocutor, se vale de um rebaixamento retórico com relação a Deus.

a) Para qual atributo divino o eu lírico apela nos quartetos? Justifique, com base no texto, a sua resposta.

b) Ao se dirigir a Deus, o argumento do qual o eu lírico lança mão se apresenta em forma de silogismo, ou seja, um raciocínio estruturado a partir de duas premissas, com base nas quais se deduz uma conclusão. Na folha de respostas, descreva, com as suas palavras, as premissas e a conclusão presentes nos tercetos do poema.

a) O eu lírico apela para a misericórdia divina, acreditando que seus pecados serão perdoados, tal como se vê no trecho “mas não porque hei pecado/da vossa alta clemência me despido”. Além disso, ele conta com a vaidade de seu interlocutor, na medida em que apela para o fato de que Deus fica lisonjeado (envaidecido) ao perdoar os pecadores.

b) Primeira Premissa:  Se a Bíblia (a “Sacra História”) afirma que o perdão divino concedido a um pecador (a “ovelha desgarrada”) resulta na glória e no prazer de Deus. 
Segunda Premissa: E se o eu lírico é um pecador (uma “ovelha desgarrada”). 
Conclusão: Logo, para manter sua glória divina, Deus deve perdoar o eu lírico.