A senhora manifestava-se por atos, por gestos, e sobretudo por um certo silêncio, que amargava, que esfolava. Porém desmoralizar escancaradamente o marido, não era com ela. [...]

As negras receberam ordem para meter no serviço a gente do tal compadre Silveira: as cunhadas, ao fuso; os cunhados, ao campo, tratar do gado com os vaqueiros; a mulher e as irmãs, que se ocupassem da ninhada. Margarida não tivera filhos, e como os desejasse com a força de suas vontades, tratava sempre bem aos pequenitos e às mães que os estavam criando. Não era isso uma sentimentalidade cristã, uma ternura, era o egoísta e cru instinto da maternidade, obrando por mera simpatia carnal. Quanto ao pai do lote (referia-se ao Antônio), esse que fosse ajudar ao vaqueiro das bestas. Ordens dadas, o Quinquim referendava. Cada um moralizava o outro, para moralizar-se.

PAIVA, M. O. Dona Guidinha do Poço. Rio de Janeiro: Tecnoprint, s/d.

No trecho do romance naturalista, a forma como o narrador julga comportamentos e emoções das personagens femininas revela influência do pensamento

  • a

    capitalista, marcado pela distribuição funcional do trabalho. 

  • b

    liberal, buscando a igualdade entre pessoas escravizadas e livres. 

  • c

    científico, considerando o ser humano como um fenômeno biológico. 

  • d

    religioso, fundamentado na fé e na aceitação dos dogmas do cristianismo. 

  • e

    afetivo, manifesto na determinação de acolher familiares e no respeito mútuo.

É comum que autores do Naturalismo utilizem princípios científicos no desenvolvimento do comportamento dos personagens de seus contos e romances. No fragmento em questão, o carinho que Margarida dedicava “aos pequenitos e às mães que os estavam criando” é explicado pelo narrador como uma consequência do “egoísta e cru instinto da maternidade” manifestando-se em uma mulher que não gerou filhos. Sendo assim, entende-se que o ser humano está caracterizado como um fenômeno biológico.