Conheço um povo sem poligamia: o povo macua. Este povo deixou as suas raízes e apoligamou-se por influência da religião. Islamizou-se. (...) Conheço um povo de tradição poligâmica: o meu, do sul do meu país. Inspirado no papa, nos padres e nos santos, disse não à poligamia. Cristianizou-se. Jurou deixar os costumes bárbaros de casar com muitas mulheres para tornar-se monógamo ou celibatário. (...) Um dia dizem não aos costumes, sim ao cristianismo e à lei. No momento seguinte, dizem não onde disseram sim, ou sim onde disseram não.

(CHIZIANE, Paulina. Niketche. Uma história de poligamia. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 92.)

Baseando-se no excerto e na leitura da obra, é correto afirmar que

  • a

    a organização familiar é fruto da vida religiosa dos povos, cabendo assim a monogamia aos povos cristãos e a poligamia aos povos islâmicos.

  • b

    os costumes culturais no modo de organizar os arranjos familiares são colocados em xeque por novas estruturas de poder, as quais transmitem outros valores. 

  • c

    a monogamia aparece como evolução natural aos costumes supostamente bárbaros de os homens se casarem com muitas mulheres em determinadas culturas africanas. 

  • d

    o povo macua tornou-se monogâmico depois de abraçar a fé cristã trazida pelo papa e padres, o que pode ser considerado um aprimoramento social.

As diferenças culturais entre a região norte e a região sul de Moçambique são muito exploradas por Paulina Chiziane no romance Niketche: uma história de poligamia. A prática da poligamia — culturalmente associada à religião islâmica e, por exemplo, ao povo macua, que ocupa o norte do país, — é negada por esse mesmo povo em função da influência de novas estruturas de poder advindas da colonização. O mesmo ocorre no sul de Moçambique, no povoado em que a protagonista Rami foi criada, também originalmente de tradição poligâmica e que, com a influência do colonizador, tem seus costumes de organização familiar colocados em xeque, passando a negar suas tradições primeiras.